A Independência do Brasil vista como um Projeto

6 de setembro de 2018

Autoria: Ana Xavier

Colaboração: Carlos Magno Xavier

Aproveito a semana da pátria para refletir acerca do “movimento da independência do Brasil” pelo ponto de vista do gerenciamento de projetos.

Você pode ler ou ouvir o post.

 

Projeto “Independência do Brasil”

O Guia PMBOK®, desenvolvido pelo Project Management Institute (PMI), é um guia das melhores práticas de gestão de projetos. Ele mostra ‘o que fazer’ para potencializar o atingimento das metas dos seus projetos. A 6º edição aponta 10 áreas de conhecimento para o gerenciamento: Escopo, Cronograma, Integração, Custos, Qualidade, Recursos, Comunicações, Riscos, Aquisições e Partes Interessadas. Desmembraremos a independência do Brasil pela ótica de cada área de conhecimento.

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Cronograma (Tempo)

Engana-se quem pensa que a independência foi somente um "Grito do Ipiranga" às margens plácidas de um riacho. O grito foi o resultado de um conjunto de ações que estavam em curso rumo à independência. Vamos entender:

Ideias liberais e republicanas começaram a surgir após a independência dos EUA (1776) e a Revolução Francesa (1789-1799), crescendo a indignação pelo colonialismo. Nesta mesma época, crescia a insatisfação da elite agrária, política e comercial brasileira por conta dos altos impostos, pelo desejo de liberdade econômica para ampliar o comércio de seus produtos e se libertar das exigências de Portugal. Com isso, iniciaram-se vários movimentos sociais no país contrários ao domínio português, como a Inconfidência Mineira(1789) e a Conjuração Baiana (1798). Esta é a etapa de proposta de um projeto, onde uma motivação (ameaça ou oportunidade) nos leva a pensar em soluções para o alcance de objetivos. Esta proposta precisa ser “vendida” para os stakeholders (partes interessadas) do projeto.

Com a ameaça de invasão das tropas francesas em Portugal, o projeto tem uma grande oportunidade com a chegada da família Real ao Brasil, em 1808. A elite agrária brasileira se aproxima de Dom João VI e ele rompe o pacto colonial. Ali, o país deixava de ser colônia, de ser dependente de Portugal e acelerava seu desenvolvimento com a abertura dos portos, acentuando as relações com a Inglaterra, e realizando mudanças comerciais, culturais e educacionais. Nesta época, criou-se o Banco do Brasil, a Imprensa Régia, a Academia Real Militar, a Academia da Marinha, a Escola de Comércio, a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, a Academia de Belas-Artes e dois Colégios de Medicina e Cirurgia. O Museu Nacional, a Biblioteca Real, o Jardim Botânico, o Real Teatro e o Observatório Astronômico também foram fundados neste período.

Em 1815, Dom João transformou a colônia em reino, chamando de Reino Unido de Portugal e Algarves. Esta nomenclatura foi importante para reforçar a ideia de que o Brasil seguia o rumo de independência. Mas, como cada ação tem uma reação, a burguesia mercantil portuguesa, prejudicada pela guerra contra Napoleão e pela abertura dos portos brasileiros, exigiram o retorno de Dom João e a volta do comércio brasileiro exclusivo pelos comerciantes portugueses.

Em 1817 eclodiu a Revolta Pernambucana, mais um movimento separatista e a última revolta no país anterior à Independência do Brasil.

Estoura, em 1820, a Revolução do Porto, em Portugal. O regresso da família Real para Portugal era um risco do projeto e trataremos mais à frente.

Buscando agradar tanto aos portugueses quanto aos brasileiros, Dom João volta à Portugal, em 1821, e deixa seu filho Dom Pedro como regente do Brasil. Assim, a família Real marcava presença em ambos territórios. Porém, isso não foi o suficiente para os portugueses e, se sentindo pressionado, Dom João pede para Dom Pedro retornar.

Com isso, as pessoas à frente do projeto de independência do Brasil se organizaram para convencer o príncipe a ficar no país, pois era um elemento chave para o sucesso do projeto. José Clemente Pereira (presidente do senado na época) levou um abaixo assinado com 8 mil assinaturas solicitando a permanência de Dom Pedro no Brasil.

"Como é para o bem de todos e felicidade geral da nação, estou pronto. Diga ao povo que fico" pronunciou Dom Pedro. Este dia, 9 de janeiro de 1822, foi eternizado como o “Dia do Fico”. Após esse dia, as atividades do projeto foram aceleradas para não perder o timing e uma série de medidas passam a contestar a metrópole. Lembrando que o timing da época é diferente do timing atual, em que a tecnologia permite que cada dia tenha uma novidade e as respostas são quase imediatas.

No dia 3 de junho do mesmo ano, Dom Pedro não aceita a Constituição portuguesa e convoca a 1ª Assembleia Constituinte brasileira. Depois, em 1º de agosto, Dom Pedro organizou a Marinha de Guerra e obrigou as tropas de Portugal a voltarem para o Reino, considerando inimigas tropas portuguesas que desembarcassem no país. Cinco dias depois assinou o Manifesto às Nações Amigas, um documento que assegura o Brasil como “reino irmão de Portugal”, o que foi considerado uma “declaração de independência ao mundo”.

Dom Pedro estava viajando a Minas Gerais e São Paulo para acalmar alguns parceiros que estavam preocupados com uma possível desestabilização social por conta das insubordinações à metrópole quando recebeu uma carta de Portugal em resposta aos últimos acontecimentos. Os portugueses anularam a convocação da Assembleia, ameaçaram enviar tropas ao Brasil e exigiram o retorno imediato de Dom Pedro. Indignado, Dom Pedro arranca o chapéu com as cores de Portugal e, aclamado pelos que o acompanhavam, grita “Independência ou Morte” no dia 7 de setembro de 1822, às margens do riacho Ipiranga. Mas esta não é a conclusão do projeto, pois Portugal não reconhece a independência. Portanto, vamos continuar com o cronograma.

Em dezembro Dom Pedro foi coroado, com o título de Dom Pedro I, imperador do Brasil. Porém, a independência do Brasil só foi reconhecida por Portugal em 1825, após a interferência da Inglaterra nas negociações. Dom João VI assinou o Tratado de Paz e Aliança entre Portugal e Brasil, definindo que o novo país pagaria 2 milhões de libras esterlinas à Portugal. O dinheiro foi emprestado pelos ingleses e foi o primeiro empréstimo da história do Brasil. Sendo assim, o cronograma do “projeto independência do Brasil” termina apenas em 1825.

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Escopo

O escopo define todo o trabalho necessário para que o projeto seja concluído com sucesso. O escopo é planejado antes do cronograma. Porém, para o correto entendimento dos acontecimentos, achei melhor, neste artigo, começar pela cronologia e depois passar para as outras áreas de conhecimento.

Voltando ao escopo....

De forma simplificada, o escopo do nosso estudo de caso foi a mobilização da elite brasileira da época, o engajamento da família Real (que foi o patrocinador do projeto), a preparação para o país não depender politicamente e economicamente de Portugal, a formação de alianças internacionais como apoiadores do projeto, a rebelião contra as normas portuguesas e o reconhecimento, por escrito, por Portugal e demais províncias internacionais, do Brasil como reino independente.

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Custos e Recursos

Não se sabe ao certo os recursos e custos empregados neste projeto. Inclusive, este é um problema de vários projetos. Vários custos não são previstos e depois o orçamento é estourado. Um exemplo é quando você começa um negócio ou lança um novo produto/empreendimento, mas não leva em consideração, em seu business case, o valor necessário para a sustentação do negócio até que ele comece a trazer o retorno esperado.   O Brasil, para conquistar sua independência política, teve de pagar, conforme já citado anteriormente, dois milhões de libras esterlinas para Portugal.

Partes Interessadas (stakeholders)

Vemos, no estudo de caso, a importância do engajamento dos stakeholders:

  • Os heróis, como Tiradentes da Inconfidência Mineira, que inspiraram a equipe e os envolvidos no projeto;
  • Os dirigentes do projeto, como os irmãos Antônio Carlos e José Bonifácio de Andrada e Silva e o Visconde de Cairu, José da Silva Lisboa, que arquitetaram as ações (não todas);
  • O responsável pelo abaixo assinado pedindo para Dom Pedro ficar, que foi o José Clemente Pereira;
  • O patrocinador do projeto, Dom Pedro, que disponibiliza os recursos e contatos para o projeto;
  • Outros que certamente tiveram um papel importante na independência do país.

Um ótimo exemplo de gerenciamento de stakeholders foi a ida de Dom Pedro à Minas Gerais e São Paulo para acalmar alguns parceiros que estavam preocupados com uma possível desestabilização social por conta das insubordinações à metrópole. Hoje em dia temos diversas formas de encurtar distância, porém, para asseguramento, não existe aplicativo melhor que o contato humano. Mas nem tudo precisa ser comunicado pessoalmente e é no plano de comunicação que você irá definir como isso será feito e em quais momentos utilizar qual ferramenta disponível.

Vamos ver a seguir.

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Comunicação

A gestão da comunicação engloba mapear as informações pertinentes para cada grupo envolvido no projeto, assim como a forma, o canal, o tom e a periodicidade. Na época da independência, utilizava-se muito a carta como meio de comunicação. Já a população sabia dos acontecimentos mais importantes pela imprensa ou pela distribuição de folhetos na rua, mas só era transmitido para eles o necessário. Assuntos mais delicados eram tratados pessoalmente e a informação era bastante segmentada, apenas quem precisava saber ficava sabendo. Outra característica da época é o tempo que se levava para obter uma informação. Dom Pedro convocou a 1ª assembleia em junho, Portugal tomou conhecimento, respondeu e ele só recebeu a resposta em Setembro. Hoje já temos mais canais, como e-mail, whatsapp, Skype, telefone, redes sociais etc. É importante definir quando usar cada um, com quem e o momento certo. As mudanças ocorrem rapidamente, não há espaço mais para delays. Se a independência fosse nos dias de hoje, Dom Pedro receberia uma resposta (provavelmente uma ligação – não whatsapp porque ligação é melhor para urgências) no mesmo dia da convocação da Assembleia.

Uma forma de comunicação que é mal utilizada hoje em dia são as reuniões. Quantas vezes você foi em uma reunião e pensou: “que perda de tempo! Resolveria isso em 1 e-mail”.

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Riscos

O projeto independência do Brasil foi repleto de riscos. Mas nem todo risco é ruim, a definição de riscos segundo o PMBOK® Guide é: “um evento ou condição incerta que, se ocorrer, provocará um efeito positivo ou negativo em um ou mais objetivos do projeto”. Portanto, você deve identificar ameaças e oportunidades para o projeto e se preparar para melhor atendê-las.

Alguns riscos que podemos observar:

  • Morte – Os movimentos sociais foram importantíssimos para mobilizar e engajar a população na causa, muitos deram sua vida para a conclusão do projeto.
  • Família Real vem ao Brasil – esta foi uma ótima oportunidade para o desenvolvimento do país, que só foi possível pela aproximação e influência da elite agrária, política e comercial brasileira com Dom João VI e Dom Pedro I.
  • Abertura dos portos – a possibilidade de negociações externas com outros países possibilitou a independência econômica.
  • Família Real volta para Portugal – Dom João VI voltou a Portugal e conseguiria recolonizar o país, se não fosse pela percepção dos dirigentes do projeto no interesse de Dom Pedro em ser imperador.
  • Guerra com Portugal – este risco foi prevenido por mostrar a força militar brasileira, após alguns anos da criação da Academia Real Militar e a Academia da Marinha, enquanto Portugal estava enfraquecido após a guerra com Napoleão. Mas foi também por conta da aliança do Brasil com a Inglaterra, que tinha interesse em fazer negócios direto com o país, sem passar pela metrópole.

Certamente o projeto teve outros riscos e respostas, porém, para você não ficar lendo este artigo até amanhã, vamos encerrar esta área de conhecimento aqui.

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Qualidade

Esta área de conhecimento aponta e gerencia os processos e normas de qualidade que devem ser seguidos no projeto.

Ao contrário da maioria dos países que conseguiram sua independência, o projeto do Brasil foi praticamente pacífico, com movimentos sociais breves, e manteve a estrutura social e política praticamente intacta.

 

Integração

Podemos perceber que foi um conjunto de ações bem articuladas que direcionaram o Brasil para uma independência praticamente pacífica. Alianças e contestações ao regime português forma feitas nos momentos certos, envolvendo as partes interessadas e com o cuidado de primeiro desenvolver as atividades comerciais, culturais e educacionais no Brasil para sermos independentes não só politicamente, como economicamente.

OD:	 icon206338_15.tif
Autor/Criador:	Musso, Luiz
Título:	Caixa de Amortisação.
Outros Títulos 	Caisse d'Amortisation.
Data:	[191-].
Em:	Vues de Rio de Janeiro.
Dimensões do original:	1 foto : papel albuminado :
Tipo de documento original:	fotografia
Direitos:	Biblioteca Nacional (Brasil)
Back up:	HD-007 DVD-0094

Aquisições

O nome já explica esta área de conhecimento, responsável por gerenciar a compra dos produtos e serviços necessários para a conclusão do projeto. Para o Brasil ser economicamente independente, fez-se necessário investir em escolas, comércios, museus, bibliotecas e na imprensa. E a definição do momento certo para a compra de cada produto e/ou serviço, do fornecedor e da forma de pagamento faz parte do gerenciamento de aquisições.

 

Vimos neste artigo que podemos olhar para o passado e analisar a independência do Brasil pela ótica do gerenciamento de projetos.

Agora o momento é de olhar para o futuro, pois precisamos transformar nosso país em um lugar melhor para se viver, o que demandará inúmeros projetos e competentes equipes para gerenciá-los. Desenvolva essa competência, pois vamos precisar de pessoas que transformem ideias em realidade. Como dizia Peter Drucker, “a melhor maneira de prever o futuro é criá-lo”.

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